Colunistas

Vantagens e desvantagens da autorregulação privada

ANO 2017 NUM 333
André Saddy (RJ)
Professor de Direito Administrativo da Faculdade de Direito e professor do Mestrado em Direito Constitucional e do Doutorado em Justiça Administrativa da Universidade Federal Fluminense (UFF). Pós-Doutor pelo Centre for Socio-Legal Studies da Faculty of Law da University of Oxford, Doutor em Direito Administrativo pela Facultad de Derecho da Universidad Complutense de Madrid, Mestre em Administração Pública pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e Pós-graduado em Regulação Pública e Concorrência, pelo Centro de Estudos de Direito Público e Regulação (CEDIPRE) da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Sócio-fundador do escritório Saddy Advogados.


22/02/2017 | 10721 pessoas já leram esta coluna. | 1 usuário(s) ON-line nesta página

Como visto em nossa primeira participação na revista Colunista, a autorregulação nada mais é que o estabelecimento, por meio de um documento escrito, de normas de conduta e padrões de comportamento criados por entes extraestatais ou não, cujo cumprimento foi fixado previamente como objetivo a ser seguido por aqueles que elaboram, aprovam e subscrevem ou aderem a essa autorregulação (pessoa física ou pessoa(s) jurídica(s)). Trata-se, portanto, de um documento produtor de direito, à margem do Estado ou não, no qual as partes efetivamente impõem a si mesmas um elenco de comportamentos, em definitivo, de boas práticas para ditar normas que regiam sua própria atividade. É, resumidamente, a regulação exercida pelos próprios agentes aos quais se destina, realizada, portanto, por pessoas físicas ou jurídicas, ou grupo destas, que autolimitam ou cerceiam suas liberdades de escolhas futuras (SADDY, André. Regulação Estatal, Autorregulação Privada e Códigos de Conduta e Boas Práticas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 87).

Existem motivos mais que suficientes para desconfiar da criação e implementação da autorregulação privada, afinal, quem autolimitaria suas próprias decisões em prejuízo a si mesmo? É fato que essa espécie de autorregulação visa atender a interesses corporativos, tais como a melhoria da imagem da categoria perante o público consumidor ou usuário, a sociedade e o Estado, a inibição ou até mesmo o combate de práticas de concorrência desleal, a melhoria na qualidade e até a diminuição da regulação estatal, o fomento à ideia de responsabilidade social da atividade ou empresa ou profissão, entre outros. Agora, também é verdade que os objetivos da autorregulação privada podem ser benéficos ao mercado. Daí porque a necessidade de se vislumbrar as vantagens e desvantagens do sistema.

1. Vantagens da autorregulação privada

São inúmeras as vantagens do sistema de autorregulação privada, entre as principais, pode-se citar que é um sistema de maior eficácia, eficiência, flexibilidade e economia. A presença de tais prerrogativas faz dele um sistema verdadeiramente aconselhável, sendo alternativa factível para qualquer agente ou conjunto de agentes econômicos (JORDAN, Cally e HUGHES, Pamela. Which Way for Market Institutions: The Fundamental Question of Self-Regulation. Berkeley Business Law Journal, Berkeley, v. 4, n. 2, p. 205-226, fall 2007, p. 212).

A primeira e, talvez, a principal vantagem da autorregulação privada é a eficácia e a eficiência que esta forma de regulação pode trazer. Por ser realizada pelos próprios agentes, a autorregulação possui como vantagem o conhecimento técnico que muitas vezes a Administração não possui, o que lhe confere a capacidade de produção de normas com maior eficácia e eficiência. Assim o é porque quem elabora as normas são pessoas capacitadas, que conhecem o objeto da regulação e a vivência do mercado. Na autorregulação privada, as normas possuem uma maior adequação às necessidades do mercado, já na regulação estatal, por mais que o ente possua a característica da permeabilidade, as normas pelo Estado editadas poderão se distanciar da realidade. O autorregulador privado, dessa forma, distintamente do regulador estatal, produz normas de conduta com um grau de detalhamento superior a este, por conseguinte, atendendo melhor as diferentes demandas do mercado. Além disso, as normas autorregulatórias podem cobrir eventuais lacunas de caráter legal e, até mesmo, substituírem essas.

Dessa forma, os agentes econômicos se autorregulam porque são eles interessados na qualidade da regulação exercida sobre a sua atividade. Pode-se dizer que os mesmos cansaram de ser regulados pelo Estado de forma ineficiente. Ora, são os regulados os maiores conhecedores do ramo em que atuam, e a falta de capacidade do Estado em investir recursos humanos capacitados levou os agentes econômicos a buscarem, na autorregulação, um meio de se proteger da intervenção estatal executada de modo distorcido, sem a tecnicidade devida e, até mesmo, com a função populista de privilegiar programas de interesse de determinado Governo.

A autorregulação, nestes casos, funciona como uma espécie de regulação preventiva. A ideia é estabelecer normas de boa convivência a fim de consagrar um padrão mínimo de segurança jurídica e confiança legítima, sempre tentando estabelecer mecanismos de previsibilidade das ações.

expertise, por conseguinte, tende a assegurar uma regulação melhor, existindo a tendência a uma maior adesão e receptividade destas ao público-alvo quando comparada às normas emanadas pelo regulador estatal. A autonomia de vontade, em participar, de um sistema autorregulatório traz mais eficiência do que o mecanismo de "comando e controle", típico da regulação estatal, afinal, por existir uma participação efetiva na elaboração, sentem-se, seus criadores, moralmente compelidos a cumprir as normas por si mesmos criadas. São, portanto, normas com maior legitimidade do que as estatais. Na autorregulação privada, portanto, as partes obedecem normas por simples comprometimento à sua vontade, já na regulação estatal, se obedece às normas por estas possuírem, basicamente, o atributo da imperatividade.

As vantagens citadas permitem, segundo Vital Moreira (MOREIRA, Vital. Auto-regulação Profissional e Administração PúblicaCoimbra: Almedina, 1997, p. 93 e 94):

[...] superar dois dos obstáculos clássicos à regulação estatal: as dificuldades práticas da implementação dos programas reguladores face à resistência dos operadores econômicos e o problema da legitimação das medidas reguladoras impostas em nome de interesses gerais da sociedade.

Luiz Roberto Calado (CALADO, Luiz Roberto. Regulação e autorregulação do mercado financeiro: conceito, evolução e tendências num contexto de crise. São Paulo: Saint Paul, 2009. p. 58) também enumera as vantagens descritas:

Uma entidade autorreguladora, ao obter adesão dos participantes do mercado, está mais próxima das atividades que propõe regular, dispondo, portanto, de maior sensibilidade e destreza para avaliar as condições e normatizá-las. Esses aspectos favoreceriam a condução de políticas de custos mais moderados e com maior grau de previsibilidade de seus efeitos. Consequentemente, ameniza-se a dissonância cognitiva entre os agentes, a qual ocorre sempre que demandantes de regulação não têm a adequada percepção do valor contido na informação gerada pela regulação. Com isso, diminui-se a frequência em que as normas tornam ambíguas ou são interpretadas incorretamente. Por outro lado, a elaboração e o estabelecimento, pela própria comunidade, das normas que as disciplinam faz com que aumente a sua aceitação, concomitante a uma maior responsabilidade no seu cumprimento, o que diminui a necessidade de intervenção do órgão regulador.

A autorregulação apresenta outra vantagem, que é permitir ao agente econômico o autocontrole da atividade por si desenvolvida, afinal, implica a adoção voluntária de uma série de compromissos de melhora contínua, com isso, contribuindo para elevar o nível de qualidade e de segurança legalmente estabelecido e melhorar a imagem da sua marca. Também, existe para criar mecanismos que diferenciem seus agentes da concorrência, seja por meio de um selo, símbolo ou distintivo facilmente reconhecível pelo consumidor ou usuário ou não, além de ser possível estabelecer um sistema de resoluções de conflitos simples e econômicos juntamente com a instauração de reclamações na ocorrência de eventuais abusos. O ideal que se almeja é o aumento da credibilidade da atividade, atraindo mais investimento e captando mais clientes ou fregueses para a mesma.

A autorregulação pode fomentar, com isso, a confiança e as virtudes dos trabalhadores ou empregados e dos consumidores ou usuários, motivando os primeiros a trabalhar ou empregar com maior eficiência e incentivando os segundos ao consumo (uso) dos bens e serviços ofertados. Logo, melhora a reputação da empresa, aumenta a confiança dos clientes ou fregueses e, além de tudo isso, afeta a obtenção de vantagens competitivas, contribuindo para o incremento e a otimização da rentabilidade e dos resultados econômicos das empresas ou profissionais, afinal, existirá um aumento no nível de satisfação e confiança dos trabalhadores ou empregados e dos consumidores ou usuários. É possível, dessa forma, a autorregulação privada estimular a competição entre bens e serviços ofertados, e isso significa que pode existir um incremento na concorrência entre os agentes econômicos, bem como o efetivo compartilhamento e o respeito do nome dos agentes econômicos com o intuito de tutelar e proteger efetivamente consumidores ou usuários.

A autorregulação pode atribuir, também, maior transparência, incrementar o nível de garantia de cumprimento e de comportamento dentro de um setor ou segmento econômico, além da própria interação entre os partícipes da atividade.

O segundo grande aspecto vantajoso da autorregulação privada é a flexibilidade. A autorregulação oferece ao agente econômico maior rapidez no que diz respeito às necessidades de mudanças do mercado (TOMASEVICIUS FILHO, Eduardo. A auto-regulação professional no Brasil. In: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella (Org.). Direito regulatório: temas polémicos. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 640). A autorregulação privada evita a demora na concessão de respostas normalmente observadas pelo regulador estatal, pois as normas emanadas pelo autorregulador podem ser revistas e incrementadas de acordo com a necessidade, sem qualquer tipo de entrave burocrático que, muitas vezes, o devido processo legal estabelece aos Poderes Públicos. Tal evita a desaceleração e o desenvolvimento do mercado. Essa capacidade de modificar as normas elaboradas conforme o ritmo e o dinamismo do mercado torna a autorregulação privada célere. Tal presteza favorece sobremaneira os agentes privados do mercado, cujas necessidades não podem aguardar a morosidade típica das respostas governamentais. Logo, a velocidade decisória é outra vantagem inerente à autorregulação.

A autorregulação privada consegue, portanto, atingir e alcançar um conjunto de circunstâncias que acaba alcançando melhor resposta às necessidades complexas e de mudanças do mercado. Essa possibilidade de estabelecer normas com maior rapidez e eficácia que a regulação estatal pode abrir caminho, também, à intervenção normativa do Poder Público em matérias de que não conheça com profundidade ou sobre aquelas que não lhe resultariam fácil aprovar a partir de uma regulação a curto prazo.

A elaboração de um instrumento autorregulatório é sempre muito mais fácil e ágil que a de normas legais ou regulamentares. Também, muito mais flexível quanto ao seu conteúdo e aplicação. Nestes casos, a autorregulação pode servir para evitar que se aprovem e apliquem normas de caráter imperativo, que os particulares entendem provocar efeitos negativos no setor ou segmento econômico que atuam.

Em relação ao terceiro aspecto citado, a economicidade, a autorregulação privada internaliza custos que seriam, provavelmente, imprescindíveis de serem realizados pelo Estado. A autorregulação privada evita, inicialmente, a criação de novos entes e órgãos estatais. A ausência da autorregulação, no geral, cria a obrigação estatal de regular, provocando um aumento de custos para este, além, é claro, de liberar o Estado para concentrar seus esforços em setores mais sensíveis, desonerando-se de regular toda e qualquer atividade. Muitos segmentos podem funcionar melhor via autorregulação. Ademais, na autorregulação, os custos são suportados pelos próprios agentes, já na regulação estatal, existe um suporte via tributos ou por taxas de regulação. Independentemente, o agente acaba sendo quem financia a estrutura. A vantagem é que a gestão privada via autorregulação estimula maior eficiência, pois, se os custos da autorregulação forem excessivos, ela deixa de compensar. Evita-se, também, a duplicidade de normas. Não que esta se extinga, afinal, normalmente, o Estado acaba incorporando as normas autorregulatórias à legislação.

Ainda no que diz respeito à economicidade, em consequência da maior adesão, receptividade e cumprimento das normas autorreguladoras, dá-se a diminuição com o custo da fiscalização ou supervisão, visto ser constrangedor descumprir normas que se tenha autoelaborado, aprovado e subscrito ou aderido a essas voluntariamente.

Para Luciano Portal Santanna (SANTANNA, Luciano Portal. Autorregulação supervisionada pelo Estado: desenvolvimento de um sistema de corregulação para o mercado de corretagem de seguros, resseguros, capitalização e previdência complementar aberta. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 257, p. 183-211, maio/ago. 2011, p. 190):

[...] a autorregulação pode provocar uma redução da regulação estatal, por diminuir a necessidade de intervenção do Estado. Tem-se aí um cenário com maior eficácia regulatória, com benefícios não apenas ao consumidor, mas ao próprio Estado que, além de fruir de uma natural desoneração administrativa e financeira, poderá utilizar seus recursos de uma forma mais racional, propiciando uma ação seletiva sobre o mercado. Os agentes do mercado, por sua vez, tendem a aceitar com maior facilidade a ação regulatória de seus pares, cujo nível de compreensão e interesses sobre a atividade lhes são comuns, ao contrário do que ocorre com a burocracia estatal.

A redução dos custos regulatórios é outra vantagem da autorregulação. A regulação estatal pode trazer alguns impactos negativos, principalmente se o ente regulador não possui independência e está distante dos regulados.

A autorregulação privada pode facilitar no cumprimento da legislação aplicável, pois é comum que as normas esclareçam o que se aplica à atividade, ao setor ou ao segmento. Também pode existir um autocontrole ou um órgão específico que controle de forma independente. Pode a autorregulação privada, da mesma forma, contribuir para um procedimento eficaz de garantia à defesa dos administrados, em especial, dos trabalhadores ou empregados e dos consumidores ou usuários. Por fim, por poder existir mecanismos de resolução extrajudiciais de conflitos, haverá, certamente, uma diminuição do número de processos judiciais, além de maior legitimidade, pois o julgamento é feito pelos pares, bem como maior eficácia na aplicação de sanções. Logo, a autorregulação privada pode eliminar numerosos custos, uniformizar as atuações dos administrados e, ao mesmo tempo, gerar confiança e segurança.

2. Desvantagens da autorregulação privada

Na autorregulação privada, também, existem desvantagens. Isto é, existem dificuldades que devem ser levadas em consideração, mesmo sendo esta iniciativa vantajosa em muitos pontos. Talvez, a principal desvantagem gire em torno da compatibilidade da intenção de lucro que os agentes possuem com o desempenho da atividade regulatória isenta de conflito de interesses, além do propósito de buscar os interesses públicos e a autorregulação de qualidade. A ideia de se autobeneficiar estará sempre presente na autorregulação privada, e tal prática poderá se transformar em uma falha de mercado que terá, ao final, de ser remediada pela regulação estatal.

A autorregulação privada pode se exteriorizar como simples declarações gerais de conduta, com nenhuma indicação da maneira como estas serão implementadas. Pode, também, abordar temas não tão extensos e de pouco impacto, além de limitar as pessoas que serão abrangidas pelo instrumento. É, infelizmente, comum encontrar instrumento de autorregulação que nem sequer cobre as normas fundamentais do setor que está regulando. Também pode figurar como uma desvantagem ou um problema a falta de monitoramento independente para garantir a aplicação dos instrumentos de autorregulação. Além disso, pode a autorregulação privada adquirir uma vertente repressora, pois quem a elabora, aprova e subscreve ou adere a ela pode reforçar o poder de direção ou sanção. É comum, do mesmo modo, que determinada região tenha maior aceitação de uma conduta que outras e uma mesma empresa ou profissional pode utilizar códigos distintos para diferentes regiões, o que significaria deturpações dessas diferenças. Por fim, existe uma forte preocupação com o fato de a autorregulação enfraquecer a posição das organizações sindicais (JENKINS, Rhys. Corporate codes of conduct: self-regulation in a global economy. United Nations Research Institute for social development. Geneva, Technology, Business and Society. Programme, Paper Num. 2, April 2001).

Procura-se, assim, evitar que a autorregulação privada seja um mero mecanismo de relações públicas, dessa forma, com funções meramente propagandísticas em vez de uma tentativa genuína de melhora. Obviamente que, assim atuando, estarão os agentes econômicos sujeitos a críticas, correndo o risco de serem acusados de hipocrisia, sendo essas falhas divulgadas ao público. Perigo maior é ser a autorregulação privada vista como algo mais do que ela realmente é, sem mudar, de verdade, o que está acontecendo e enganar todos sem o menor escrúpulo. Em outras palavras, há uma possibilidade de existir má-fé no desenvolvimento da autorregulação. É importante, portanto, que os distintos instrumentos da autorregulação não sejam vistos simplesmente como um conjunto de diretrizes a ser estabelecido e cumprido para passar o tempo. Deve a autorregulação ser pensada como um processo que facilite a participação dos interessados e que forneça uma plataforma para novos avanços em termos de melhorar o impacto de quem a elabora, aprova e subscreve ou lhe adere.

Deve-se incentivar tal iniciativa, mas a autorregulação precisa ser constantemente regulada, por isso, defende-se a ideia da autorregulação regulada (SADDY, André. Regulação Estatal, Autorregulação Privada e Códigos de Conduta e Boas Práticas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015). Caso esteja alheia à fiscalização ou supervisão do Estado, e também da sociedade, é possível que seja dirigida por agentes econômicos que desvirtuam e fraudam os propósitos positivos da autorregulação para a satisfação de interesses eminentemente particulares. O Estado tem o dever de assegurar que os atores mantenham sua responsabilidade aos interesses públicos, do contrário, a autorregulação será mais um mecanismo de proteção cooperativista.

Outra desvantagem da autorregulação privada diz respeito à possibilidade de os agentes responsáveis por ela, dentro de um determinado mercado, realizarem práticas anticoncorrenciais, sejam elas colusivas ou excludentes, para, assim, favorecer quem subscreveu os instrumentos autorregulatórios ou a eles aderiu. Os instrumentos autorregulatórios podem ser utilizados como meios para limitar ou reduzir a concorrência e tal deve ser evitado. A autorregulação privada deve buscar estabelecer uma igualdade nas oportunidades de quem opera em determinados setores, de tal maneira que não se produza um desnível quanto ao acesso ou à operação nos mercados.

Outro problema é a redundância regulatória, o que gera ineficiência ao sistema como um todo. O pior cenário seria a contradição normativa e interpretativa entre o regulador estatal e o autorregulador privado.

A ausência de transparência, também, pode se tornar uma desvantagem nos sistemas autorregulatórios, bem como a falta de prestação de contas.

Deve-se advertir, ainda, que a autorregulação sempre porta consigo o grave risco de que consolide interesses dos grupos mais fortes no processo de elaboração e implantação das normas, assim, esquecendo-se dos interesses gerais e das partes mais fracas.

O desafio constante, porém, será o corporativismo tendente a reduzir o grau de excelência e rigidez das normas, seja quanto à sua elaboração ou aplicação, bem como quanto ao conteúdo voltado a satisfazer determinados fins pretendidos pelos agentes econômicos e não os interesses públicos e o bem-estar da coletividade (PÉREZ, Diego Selhane. Auto-regulação: aspectos gerais. In: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella (Org.). Direito regulatório: temas polémicos. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 592). Isso deve ser evitado e combatido. A dificuldade de se manter a imparcialidade também é grande, principalmente, quando se deve aplicar penalidades.

Em síntese, a autorregulação privada pode ser uma boa ferramenta para o desenvolvimento social e econômico, que produz benefícios consideráveis para os agentes econômicos, trabalhadores ou empregados e consumidores ou usuários, além de outras partes interessadas, como a sociedade e o Poder Público. No entanto apresenta limitações e problemas que devem ser minimizados. Significa dizer que sem a boa-fé, a autorregulação privada jamais poderá trazer os benefícios comentados. Conclui-se, assim, que, apesar dos benefícios, existem alguns problemas que devem ser devidamente enfrentados para o funcionamento adequado e, até mesmo, para a viabilidade da autorregulação privada. O sistema autorregulatório só terá credibilidade se ele souber enfrentar tais problemas.



Por André Saddy (RJ)

Veja também